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Yara aposta no crescimento agrícola do Brasil

Em viagem pelo Brasil, na semana passada, participando de um encontro internacional do conselho diretor da Yara Fertilizantes, o chairman global da companhia norueguesa, Leif Teksum, esteve por Porto Alegre, sede brasileira da companhia. Em entrevista exclusiva ao Jornal do Comércio, antes de viajar a Rio Grande, onde a Yara está fazendo grandes investimentos, o executivo falou sobre as razões que tornam o País a prioridade para a empresa mesmo apesar das crises econômicas e políticas dos últimos anos.  

“O Brasil é mais importante globalmente, hoje, para a Yara, tanto pela ótica dos investimentos já feitos como por aqueles que ainda serão. Já investimos US$ 1 bilhão e temos a previsão de mais US$ 1 bilhão, incluindo a expansão dos investimentos em Rio Grande. Além disso, temos o investimento em Sumaré, em uma moderna fábrica de fertilizantes foliares, e em mineração, em fase inicial”, resume Teksum.

Nesta entrevista, o executivo, oriundo do setor financeiro e no comando da indústria norueguesa desde 2014, fala sobre os projetos e a visão da companhia de forma global, analisando desde os impactos da era Trump ao Brexit, passando pelo interesse da empresa no restante do Brics (grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e, recentemente, África do Sul).

Jornal do Comércio – A companhia vem investindo consecutivamente no Brasil, pelo menos desde 2012, apesar da crise. Por quê?

Leif Teksum – O agronegócio brasileiro é muito interessante para os negócios, independentemente de governos ou crises pelas quais se esteja passando. O setor segue e seguirá crescendo, apesar dessa crise, e queremos manter nossa participação nesse relevante mercado. Queremos mais uma fatia desse mercado que está crescendo, aproveitar esse crescimento e aumentar nossa fatia. Isso faz parte da estratégia global de crescimento. Obviamente que nos preocupamos com a crise política e a realidade que vive o Brasil hoje, mas realmente não acreditamos que isso venha afetar o nosso negócio nem mesmo o agronegócio.

JC – Mesmo nos dois últimos anos, quando houve a troca da presidente Dilma Rousseff para o presidente Michel Temer, a empresa não segurou, redefiniu ou repensou parte dos investimentos por aqui?

Teksum – Foi justamente durante esses dois últimos anos que fizemos ou decidimos os maiores investimentos. Foi nesse período, por exemplo, que o conselho liberou mais US$ 1 bilhão em investimentos em um momento difícil do Brasil. Discutimos, claro, os riscos políticos e concordamos que, em uma visão de longo prazo, não afetaria nosso negócio nem a produção agrícola diretamente. Por isso, decidimos fazer o investimento. Em uma companhia global, como é a nossa, obviamente, avaliamos inúmeros fatores locais antes da decisão de fazer ou não um investimento. O risco político é sempre um dos temas.

JC – E a empresa está, inclusive, começando a investir em novo segmento no Brasil, o de mineração. Por quê?

Teksum – Temos algumas pequena atividades em mineração fora do Brasil, porém não é o nosso core business. Por isso, adotamos o modelo de joint venture com a Galvani, uma empresa local com muita experiência e competência na área de mineração. Nós entramos com o dinheiro, e eles, com a experiência, então é um bom conjunto para desenvolvermos a área.

JC – Quantas vezes já esteve no Brasil e como avalia, hoje, o agronegócio brasileiro?

Teksum – Eu venho do setor bancário norueguês e estou no conselho diretor da Yara há três anos. Nesta posição, vim ao Brasil apenas uma vez. Foi suficiente para ter uma visão de como ocorre a expansão da plataforma de produção de alimentos, cada vez mais profissional e competitiva. E isso irá continuar.

JC – A Yara tem investido pesado no País. Como tem sido o retorno desse investimento?

Teksum – Obviamente que o conselho sempre olha atentamente e monitora precisamente o retorno do que vem investindo. Nos perguntamos sempre se cada novo investimento de capital está tendo o retorno devido. O retorno obtido no ano passado foi acima da média global dos outros aportes da Yara, mas leva tempo para investimentos desse porte terem o retorno total dos desembolsos.

JC – Qual a sua visão sobre mudanças nos negócios globais, inclusive do agronegócio, com a nova postura norte-americana de protecionismo anunciada por Trump?

Teksum – Até o momento, não vemos maiores consequências em decisões anunciadas por Donald Trump. Mas nós esperamos e acreditamos que os políticos norte-americanos vão reconhecer a importância do crescimento mundial da agricultura, porque precisamos ampliar a produção mundial de alimentos. Por isso, não devem haver maiores barreiras ou restrições às importações e exportações que possam dificultar o fluxo de alimentos. Já o grande mercado da América do Norte é muito importante, temos boa representação por lá, mas nosso market share nos Estados Unidos é bem menor do que em outros mercados globais. As empresas norte-americanas do setor de fertilizantes têm feito grandes investimentos, e avaliamos até que existe um superávit produtivo no país. Então têm sido pequenos nossos investimentos por lá.

JC – E o que muda nos investimentos da Yara com o Brexit e a saída do Reino Unido da União Europeia?

Teksum – O Brexit não afeta nossa política no Reino Unido. Lá, atuávamos em uma joint venture com empresa local, em uma planta de produção que decidimos recentemente vender, não por questões do Brexit, mas por análises financeiras de lucros e custos mesmo.

JC – A Yara está presente em cerca de 50 países. Que outra nação recebe semelhante aporte de recursos da companhia?

Teksum – Nenhum outro país, singularmente. A Yara aloca a maior parte de seus recursos na própria região europeia, onde realmente temos nossa maior capacidade de produção. Fora da Europa obviamente, sempre olhando lugares que estão crescendo mais, e olhamos nossa produção de forma horizontal para exportamos por esses canais.

JC – Costuma-se comparar o Brasil a outros países, de certa forma, semelhantes economicamente, no grupo denominado Brics (Brasil, Rússia, Índia e China). Quais são os investimentos da companhia nesses outros países?

Teksum – A Rússia não consideramos, no momento, pela instabilidade política para investimentos. Já a China é um país importante, que exporta e importa muito, mas isso destrói o equilíbrio entre oferta e demanda em certos momentos no mercado de fertilizantes. Temos uma demanda na China por nossos fertilizantes mais especiais, especializados. Não exportamos muito para lá a variedade comum, de ureia, mas os diferenciados. Já a Índia também é um importante mercado agrícola e exportamos para lá. Recentemente, decidimos comprar por lá uma planta industrial do conglomerado Tata, no norte do país, e esperamos, há cerca de seis meses, para obter todas as licenças e autorização para operação. Mas o nosso investimento indiano é menor, bem pequeno, se comparado ao que realizamos no Brasil. São apenas cerca de US$ 560 milhões.

JC – Recentemente, a África do Sul foi incluída em países do nível dos Brics. Alguma previsão de investimento por lá no futuro?

Teksum – É sempre difícil especular sobre o futuro em longo prazo, e não podemos tomar decisões apenas em análises de curto prazo. 

 

Jornal do Comércio, 13/03/2017

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